Abrir-se ao outro – um espaço sagrado

O diálogo é construído principalmente a partir das escutas. As falas manifestam os sentimentos e reivindicações, mas a interação só se estabelece na escuta. O que escuto do outro é o que realmente promove os avanços nas relações para ambos os lados. Isso porque, quando escuto o outro, nós dois nos transformamos. Quando reconhecemos que o outro nos ouviu, muitas das adversidades se desfazem automaticamente, pelo simples fato de que a raiva é um produto da sensação de isolamento. A escuta do outro reduz a definição das fronteiras de nosso ego e permite perceber nossa “causa” num ambiente maior do que aquele restrito apenas ao meu interesse pessoal. Tudo o que alivie a sensação de solidão e encurralamento em defesa de nossa posição, possibilita uma atitude mais anfitriã. O outro passa a não ser mais o intruso e podemos então partilhar ideias e perspectivas.

Esse movimento “ritual de conversa” é muito diferente de um exercício mental de convencimento. É uma dança cujo movimento principal é deixar seu próprio “sapato” (conceitos e paradigmas) e, gradativamente, calçar o “sapato” do outro. No entanto, para fazer isso é imprescindível pisar no “chão” descalço. O chão, esse que é sagrado, é o lugar intermediário onde nos despimos – descalçamos – de uma identidade pessoal e adentramos um espaço de unicidade plena.

Sempre que no meio de uma discussão, imploramos com a expressão “Por favor, me escuta!”, estamos exortando o outro a pisar no chão com seu pé desnudo. Deixando de lado suas convicções e defesas para compreender a posição do outro – mesmo que ao final não concorde com ela. A liberdade do pé descalço é ameaçadora à identidade pessoal, ao nosso ego e é apontada pelo corporativismo de nossas afiliações como contraproducente, um risco inaceitável.

Manter a mente aberta, reconhecer um Deus único, um espaço de unicidade é um derradeiro golpe ao “sapato” do ego. Porque não há Deus único dentro de um sapato – há sim, um deus particular. Esse deus que me interessa, esse deus por encomenda, que é a matriz legitimadora de todas as minhas justificativas e argumentos, é uma prática de idolatria. Abandoná-lo não é uma traição à minha identidade. Ao contrário, diriam os profetas, é rejeitar o mais absoluto ódio a mim e à condição humana.

Dialogar é simplesmente manter a mente aberta o suficiente para que cada um possa tocar o chão com seu pé descalço. Neste momento, o espaço da escuta torna-se uma terra prometida. Será uma terra de ninguém, não por estar abandonada ou preterida, mas por se fazer patrimônio de todos.

Dica : Só a consciência de que um “sapato” está por demais apertado – produzindo calos e desconforto, ou seja, atritos interpessoais, baixa produtividade em equipe – impulsionará o esforço de mudança. Assim, durante a próxima semana, dê a si mesmo o desafio de “mergulhar” na fala do outro, toda vez que perceber um problema ou a possibilidade de melhorar um desempenho ou relacionamento. Busque descobrir como é andar com os “sapatos” do outro. Entendendo a “história” do outro, pergunte a si mesmo, como faria se estivesse em seu lugar. Poderá descobrir muito de si mesmo no outro.

Fonte: Adaptado do livro Tirando os Sapatos – Nilton Bonder

Atuo na área de desenvolvimento de competências de liderança e empreendedorismo desde 2002, utilizando metodologias ativas que fortalecem a autorresponsabilização por meio de oficinas, palestras e cursos. Credenciada como facilitadora do Seminário Empretec e da ENAP (Escola Nacional de Administração Pública) há mais de dezoito anos. Sou formada em Engenharia Elétrica pela UnB, com formações em Gestão de Pessoas com base em competência, Coach (pela Sociedade Brasileira de Coaching) entre algumas outras. Entre clientes: Grupo InPress, Banco do Brasil, Sebrae Nacional, Sebrae DF, Sebrae AP, Sebrae MG, Almeida França Engenharia, IFCT/ Volta Redonda; CTIS, PGR, entre outros.

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